Liliane Barbosa Corrêa, componente da
Equipe Co-opere, participou da publicação
"Manual do Autocuidado" - editado pela Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba. Aprecie abaixo.
GRUPO OPERATIVO
...Mas somos um grupo, enquanto
Somos capazes de,
diferenciadamente,
Eu ser eu, vivendo com você e
Você ser você, vivendo comigo.
Madalena Freire, 2008.
A teoria sobre Grupos
Operativos é uma estratégia de abordagem para quem coordena e ou facilita
processos em grupo. Atualmente é uma metodologia utilizada nas áreas da saúde,
educação, no desenvolvimento de equipes profissionais em empresas. Na área da
saúde tem sido aplicada na formação de profissionais de saúde, como também em
grupos de pacientes portadores de agravos crônicos como hipertensão e diabetes,
com enfoque na adesão ao tratamento, autocuidado e co-responsabilidade pelo
tratamento.
A coordenação
de grupos de forma operativa, seguindo a técnica preconizada, exige uma
formação específica e um estudo mais aprofundado da teoria. Por outro lado,
alguns princípios e conceitos expostos a seguir podem ser utilizados por
qualquer profissional que conduz trabalhos em grupo.
O QUE É GRUPO OPERATIVO?
A palavra
operativo deriva de operar que
significa fazer alguma coisa; produzir;
executar; realizar. O propósito da operatividade é incentivar grupos e
pessoas a agirem com autonomia, maior consciência, assumindo responsabilidades
por escolhas e ações para realizarem mudanças. No caso dos grupos de mudança de
comportamento é primeiramente acreditar que qualquer pessoa tem potencial de
mudar se quiser, e que a atividade em
grupo pode potencializar essa vontade de mudar, de incluir novos hábitos e
novas formas de pensar e agir.
Grupo operativo
é definido como uma rede de indivíduos que interagem entre si e comprometem-se com
uma tarefa. É a tarefa é o que diferencia grupo
operativo, das outras teorias que abordam processos de grupo. Ele existe e acontece
em torno de uma tarefa. Essa tarefa pode ser um objetivo, uma missão, ou uma
atividade. No grupo de portadores de doenças crônicas, por exemplo, a tarefa
como objetivo pode ser prevenir complicações da doença. Para isso tarefas como
atividade podem englobar mudanças de hábitos alimentares, melhora da adesão ao
tratamento, entre outras.
...o homem aprende
a ser Humano na coletividade, a partir das relações que estabelece com os
grupos com os quais convive e das apropriações que faz da cultura já construída.
Laura Monte Serrat Barbosa - 2007
HISTÓRIA DE
VIVÊNCIAS E CONHECIMENTOS DOS GRUPOS
Outro aspecto
importante é ter consciência de que cada
grupo e cada pessoa possui conhecimentos prévios, experiências de vida, formas
de pensar com crenças e julgamentos que fazem parte da sua história. Esse
esquema criado durante a vida, instrumentaliza
pessoas e grupos na forma de enxergar o mundo, abordar a realidade e agir. Respeitar, considerar e dar espaço para
ouvir essa sabedoria prévia é importante para quem trabalha com grupos. Assim
como acreditar que pessoas e grupos podem mudar a forma de pensar, dependendo
do contexto e da motivação. Quando o grupo cria uma forma de pensar coletiva,
que surge das contribuições individuais, a comunicação fica facilitada e flui
com menos ruídos.
QUESTÕES RELACIONADAS Á ORGANIZAÇÃO
Outro aspecto importante relaciona-se a
questões de organização dos encontros e do processo de funcionamento do grupo.
A finalidade é estabelecer alguns combinados entre coordenação e grupo, como
também entre seus integrantes. Isso propicia um ambiente favorável para realização
da tarefa do grupo, sem desperdício de energia e tempo, com atrasos,
interrupções, faltas, uso de celulares, são alguns exemplos. Fazem parte dessa
organização:
Tempo – Definição e comunicação a todos os
integrantes, do horário de início e término dos encontros, inclusive o tempo de
intervalo. Definir em conjunto com o grupo o tempo de atraso que será tolerado,
para o início das reuniões. Também a informação sobre o número de encontros
previstos. Quanto à duração dos encontros são informações em relação à carga
horária dos encontros (total e por encontro), a frequência dos mesmos (semanal,
mensal ou todos os dias).
Espaço – relaciona-se às condições ligadas à
organização do local em que acontecem os encontros: arrumação das cadeiras,
presença de excesso de materiais ou móveis na sala (estes poderão colocar em
risco a segurança dos participantes ou servirem de distratores da atenção para
o grupo), privacidade, limpeza do local. O espaço deve permitir a acomodação de
todos os participantes, possibilitando que todos se vejam.
Papéis - são posições
oferecidas pelo grupo e assumidas por integrantes, que denunciam um
acontecer ou um desejo grupal. Alguns dos papéis que espontaneamente surgem nos
grupos são: líder da mudança (apresenta a novidade, a proposta de mudança);
líder da resistência (reage contra a novidade), porta-voz (expressa a ideia,
pensamento, desejo do grupo num determinado momento), o bode expiatório
(representa as dificuldades, limitações do grupo), sabotador (sabota o trabalho
do grupo, com a intenção de mostrar que o novo ainda precisa ser mais
discutido, isto é, amalgamado pelo grupo),
representante do silêncio (é o que mostra a necessidade do grupo de fazer silêncio,
pois é nos momentos de silêncio que as reflexões e a aprendizagem do novo acontece). Não existe um
papel mais ou menos importante. Todos são necessários ao grupo, pois um
indicativo de saúde grupal é a circulação desses papéis. O que acontece em
alguns grupos é a cristalização dos mesmos em alguns participantes. Quando os
papéis não circulam é comum surgirem rótulos (ex. o chato ou o do contra que é aquele que sempre vai resistir ao novo, o bebe quieto,
que sempre fica quieto no grupo, entre outros). Isso pode paralizar o processo
de mudança do grupo.
Reconhecimento – Relaciona-se com os ganhos e/ou vantagens
percebidos por todos os envolvidos. As horas semanais dedicadas à participação
dos encontros de grupo trazem vantagens tanto para participantes como
profissionais de saúde envolvidos, como troca de experiências, resolução de
problemas em conjunto, motivação para persistir nas mudanças, por exemplo.
Tarefa – A tarefa é o grande diferencial do grupo operativo, como já foi citado
anteriormente. O grupo se depara com dois tipos de tarefa. A primeira é a tarefa objetiva, a que é o motivo pelo
qual o grupo se reúne, os objetivos a serem atingidos nos encontros do grupo,
ou mesmo a atividade que vai ser desenvolvida em um determinado encontro. Outra
tarefa subjacente à primeira é a tarefa
subjetiva. Esta se relaciona com os conflitos vivenciados no grupo, a maneira
de lidar com eles, julgamentos, crenças, como o grupo lida com a diversidade,
preconceitos, medos que naturalmente aparecem na realização da tarefa objetiva
de qualquer grupo. Citar Pessoas que já tentaram perder peso sem sucesso podem imaginar
e que é um grande sacrifício de deixar de comer o que gostam, ou que fazer
exercício físico exige um esforço acima da sua possibilidade.
Essas ideias não devem ser abafadas e nem
reforçadas pelo coordenador e sim trazidas para a reflexão do grupo. A tarefa
subjetiva representa os momentos do grupo e precisa ser vivida pelo grupo, para
que ele utilize seu potencial criativo e de inovação para resolver a nova
situação.
MOMENTOS DO GRUPO
Toda proposta de mudança de comportamento,
atitude ou hábito, representa uma situação nova para um grupo, gera tensão e
esta desencadeia uma tarefa subjetiva. Medos, ações defensivas, relações de
dependência e competição fazem parte do movimento do grupo, que aparece como:
Confusão – No momento
inicial, o grupo vivencia a confusão, o não entendimento de qual é a tarefa ou
a atividade. O medo de não entender o
que é para se fazer e o não reconhecimento dos recursos que o grupo possui para
realizar a tarefa, gera uma postura de dependência em relação ao coordenador.
Surgem falas como falas como: o que é
para fazer mesmo? Dá para repetir? Como é que é? Não entendi nada... O papel do coordenador nesse ponto é não
alimentar a dependência e deixar o grupo vivenciar essa confusão inicial e
permitir que ele próprio descubra por si que tem potencialidades para entender
e resolver a tarefa.
Dissociação - é o momento sequente pelo qual passa o grupo,
ao vivenciar o medo de se sentir
incompetente de não atingir uma expectativa ou de desagradar, de se mostrar
frágil, de provocar conflitos. Frente a esses medos podem aparecer defesas e ou
resistências que procuram aliviar e reequlibrar a tensão vivida no sistema
grupal. O grupo já sabe qual é a tarefa e começa a identificar as
potencialidades que tem para solucioná-la.
O que é percebido por quem observa o grupo são pontos de vista
diferentes, propostas de caminhos diversos para resolver a tarefa, polarizações
e possíveis impasses, para solucionar a tarefa. O papel do coordenador é deixar
o grupo viver o conflito, discutir, compartilhar, sem tomar partido de uma ou
outra ideia ou de reforçar positiva ou negativamente algum participante; e
intervir para que o grupo retome seu objetivo que é a realização da tarefa e não
vaidades pessoais ou questões individuais.
Reflexão – O grupo se depara com o medo de perder o já
conquistado, o que em algum momento foi aprendido e que a partir de agora não
serve mais. Apresenta momentos de reflexão, pois as diferentes proposta que
surgiram no momento anterior se integram e geram um resultado maior que a soma
das partes individuais. Esse momento
aparece na forma de períodos de silêncio e é importante não
interrompê-los e permitir que o grupo
viva o silêncio e acomode novos pontos de vista e aprendizagens, “pois é no silêncio que o caos é digerido,
assimilado, pensado.” (FREIRE, 2008).
Esses momentos grupais são sucessivos e frente
a uma nova situação, o grupo passará por todos os momentos novamente, pois uma
nova tensão gera confusão, que gera dissociação, que gera reflexão e mudança.
ATITUDES OPERATIVAS
As atitudes
operativas são intervenções verbais ou gestuais que promovem movimento do grupo
quando este paraliza em algum dos momentos descritos. Desta forma, as
intervenções possibilitam ao grupo retomar o foco na solução de impasses e
conclusão da tarefa.
A escolha da
intervenção a ser utilizada depende do contexto grupal, considerando sua
tarefa, suas interrelações, sua dinâmica. As intervenções não são receitas que
podem ser utilizadas aleatoriamente. O que funciona num grupo pode não ser
eficaz em outro.
Mudança de situação
Quando ocorre
polarização da discussão ou o grupo aborda temas não relacionados à tarefa, o
coordenador propõe uma mudança de situação perguntando, por exemplo, o que o
isto tem a ver com a tarefa do grupo. Gestos e atitudes não verbais como mudar
a postura na cadeira, sentar-se em outra cadeira no círculo ou trocar de lugar
com participantes que sentam sempre no mesmo lugar também são mudanças de
situação.
Informação
Quando
o grupo não entende ou tem dúvidas quanto a um conteúdo, o coordenador pode
esclarecê-lo, orientá-lo quanto às fontes de informação ou relembrá-lo sobre o
que já foi discutido em momentos anteriores. Informar sobre o tempo despendido
para a realização de uma etapa também é importante.
Acréscimo à modalidade utilizada pelo grupo para aprender
Quando o grupo
paralisa em torno de situações como a falta de recurso para fazer atividade
física, por exemplo. O coordenador pode questionar que ideias o grupo tem para
resolver essa situação.
Modalidade de alternativa múltipla
O coordenador
fornece algumas possibilidades ao grupo para que ele escolha qual é a mais
conveniente. São dadas diferentes alternativas, como por exemplo procurar
informação na cartilha alimentação saudável, ou convidar o nutricionista para
vir ao grupo, ou procurar em revistas ou na internet,
porém o grupo é quem decide.
Proposição conflitiva
Quando o grupo
permanece na zona de conforto, o coordenador faz uma proposição que gera
conflito. Se alguns integrantes sugerem a interrupção do trabalho, por exemplo,
questionar o grupo sobre os impedimentos para isso retira-o da dependência e
propõe um conflito no qual todos decidem. Pessoas trazem como tarefa da semana
como não comer mais gordura em nenhum dia. do grupo vem com decisões
idealizadas, como fazer os dez passos para alimentação saudável de uma só vez .
O coordenador apresenta uma possível dificuldade que possa aparecer para o
grupo refletir
Explicação intrapsíquica
É uma intervenção que explica o
movimento interno do grupo para a tomada de consciência do que está acontecendo.
O coordenador comenta o que observa, por exemplo, ao citar ar que o grupo está
irritado por não ter mudado tudo de uma vez só na alimentação, ou por não ter
perdido o peso desejado após as mudanças. Também aponta avanços no processo.
Mostra
Esta
intervenção permite que o coordenador não assuma um papel diretivo
complementando a dependência do grupo em realizar sua tarefa ou conseguir
aprovação. São intervenções por meio de gestos como: fixar o olhar em um ponto
no infinito, sinalizar com as mãos que a tarefa é do grupo., apontar a cartilha
de alimentação como fonte de esclarecimento de dúvidas, sentar no lugar onde um
integrante sempre senta , entre outros........
Barbosa (2006)
propõe mais três intervenções como:
Vivência do conflito
É importante
que o coordenador deixe o grupo viver o conflito, sem intervir imediatamente,
resistindo ao apelo mesmo silencioso do grupo para que ele intervenha para
resolver as situações conflituosas.
Problematização
Quando o grupo
pensa que uma solução é fácil, o coordenador problematiza, ou seja, agrega
elementos dificultadores para amadurecer a discussão. Fazer perguntas ou propor
situações como fazer exercício físico em dias de chuva e frio, como se
comportar na feijoada no final de semana, como lidar com a pressão da família
devido à mudança de cardápio, por exemplo.
Destaque do comportamento
É uma
intervenção na qual o coordenador diz ao grupo que um comportamento mudou. Se
durante alguns encontros o foco do grupo não é a tarefa, quando este
comportamento muda o coordenador destaca o fato. Ele informa, por exemplo, que
no início o grupo não tratava a tarefa no aqui e agora e neste momento passou a
realizar a tarefa do grupo no presente.
Estas atitudes
devem ser utilizadas com parcimônia, em momentos chaves, pois o excesso de
intervenções pode desgastar esse recurso e deixar de produzir a operatividade.
INFORMAÇÕES
SOBRE POSTURA DE UM COORDENADOR DE GRUPOS
- Ser um co-pensor – pensar junto com o grupo e
não pelo grupo;
- Facilitar o
diálogo – esclarecer ruídos na comunicação, convidar o grupo a pensar e buscar
alternativas dentro do grupo;
- Sair do
centro – não dar respostas prontas, devolver perguntas e questionamentos para o
grupo, evitando reforçar a dependência em relação à coordenação;
- Não impor
ideias ou coagir o grupo;
- Estar aberto
para o inesperado que surge da produção de um grupo, pois muitas vezes esta não
atende a expectativa imaginada ou idealizada pelo coordenador;
- Intervir
apenas quando houver dificuldade na comunicação, paralizações e impasses no
grupo. O excesso de intervenções pode atrapalhar o caminhar do grupo;
- Observar e
perceber os momentos e movimentos do
grupo , relacionados à tarefa subjetiva.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BARBOSA, L.M. A
Psicopedagogia e o mome to do aprender. São José dos Campos: Pulso, 2006;
BLEGER, J.
Psicologia da conduta. Porto Alegre, Artes Médicas, 1984;
FREIRE, M.
Educador, Educa a dor. São Paulo: Paz e Terra, 2008;
OSÓRIO, L.C.
Grupos: teorias e práticas – acessando a era da grupalidade. Porto Alegre:
Artes Médicas Sul, 2000;
PICHON-RIVIÈRE,
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Martins Fontes, 2005;
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Teoria do vínculo. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991;
ZENÍCOLA, A.M.;
BARBOSA, L.M.; CARLBERG, S. Psicopedagogia: saberes/olhares/ fazeres. São José
dos Campos: Pulso, 2007.